terça-feira, dezembro 20, 2011

Pausa para o picolé: "Partilha"


Este instante foi registrado numa praça de Petrópolis (RJ), durante o passeio de 30 crianças da rede pública de ensino de São Gonçalo à cidade imperial... (21.12.2011)

***

A "tia" falou: "Dá um pedaço pra fulana". Essa partilha a que nos forçam quando somos pequenos é um tanto desagradável. Pior ainda ter que dividir o último pedaço ou o último biscoito com alguém que acaba de chegar no exato instante em que estamos prestes a colocar na boca aquela delícia derradeira. O irmão mais velho sempre ouve dos pais "Deixa sua irmã brincar também!" ou "É pra dividir pr'os dois!". Mas devemos convir que não são frases animadoras. Talvez possamos forçar a análise pro lado sociológico afim de explicar que a individualidade não tem sido vivida em benefício da coletividade, de forma tal que os pronomes possessivos nunca estiveram tão em alta na cotação da sociedade capitalista. Pode ser... É bem possível que seja... Minha bisa - falecida em 1985, embora minha avó tenha dado ultimamente pra negar o fato de que sua mãe já 'partiu pra casa do pai' - costumava proferir o seguinte ditado: "Quem parte e reparte e não fica com a melhor parte, é bobo ou não tem arte". Creio que seja este o lema dos banqueiros e daqueles que cuidam atualmente da salvação do Euro por meio da 'socialização das perdas'. Ah se a mesma socialização ocorresse nos ciclos de alta do capitalismo... Diante disso, como  não entender a pequena da foto, levemente tensa por ver seu picolé abocanhado pela coleguinha? O genuíno desejo de partilhar é coisa que se edifica com prática e exemplos. Hemos de rever ambos. E haverá época do ano melhor para essa reflexão?!

- Ho ho ho!  

segunda-feira, dezembro 19, 2011

Leveza

É dessa leveza que a vida é feita...
Uma leveza que a levedura nos acrescenta
Provoca a vida em câmera lenta
E todas as cenas diante dos olhos
Num continuum que pede para se prolongar
Que pede para durar além do próximo copo
E, quem sabe, além do próximo corpo
Que pede para colar-se ao teu
Que pede para ser fiel
E nada mais há para ser pedido
Visto que o pedido ficou suspenso
Enquanto aguardamos os próximos atos
Dessa obra inacabada, chamada vida, chamada chama
E que clama para ser vivida, porque não podemos desperdiçar emoções
Porque estamos sós
Porque investimos tempo, suor e gozo,
Porque queremos a sensação da vitória
Porque voltar pra casa seria o oposto da glória
E ninguém quer ser filho pródigo na porta dos pais
Queremos mais, sempre
Nenhum barco de primeira viagem há de almejar o cais
Porque nossos planos pedem concretização, ação
E sois mais são quando vives a humana leveza de embriagar-se
E deixar-se ausente do chão, outra dentre tantas ilusões
Que construímos, apenas e tão somente com o sentido de caminhar
E ser terra, e ser água e ser semente.
Até florescer, até germinar...
-E depois?
Sois mar, sois cais...
E cada chegada é também partida.
É dessa alternância que é feita a vida, ida, finda...

Enquadramentos...



Rua do Sr. Manoel Pena de Mesquita Pinto, popularmente apelidada Rua do Ouvidor, fonte das notícias do século XIX... Quando as ruas são mais que números e letras desconexas, a história nos espreita. 



domingo, dezembro 18, 2011

Aquarela

Brasília - DF (Esplanada dos Ministérios)

quinta-feira, dezembro 08, 2011

O olhar do 'outro'


 Em 2007, alguém escreveu as seguintes palavras sobre mim: 


"Existe uma pessoa que está ao seu lado, silenciosamente apenas no movimento barulhento das coisas aparentes, porque percebe que o mestrado é apenas pretexto para você empreender a busca da tempestade (sem o risco dos trovões que ferem, mas com os raios que nos alentam). Creio que sou um dos pouquíssimos a perceber você na totalidade, senão o único, e isso é ouro". 


Hoje, o mestrado é passado. Na minha porta bate um doutorado costurado ao longo de meses,  meses de enormes transformações geográficas e subjetivas... Mesmo com tantas reviravoltas, mesmo depois de me reinventar e me perder e redescobrir, percebo essa busca incessante pela tempestade "sem o risco dos trovões que ferem, mas com os raios que nos alentam". Há aquelas pessoas que surgem em nossas vidas para nos explicar a nós mesmos, pessoas que nos decifram... Saudades de alguém que, com toques de poesia, exerça esse papel nos dias de hoje...  Essa tal de autoconsciência é coisa árdua! 









segunda-feira, novembro 21, 2011

Alto, alto...

Sobre embriagar-se:
‎"É preciso estar sempre embriagado. Eis aí tudo: é a única questão. Para não sentirdes o horrível fardo do Tempo que rompe os vossos ombros e vos inclina para o chão, é preciso embriagar-vos sem trégua. Mas de quê? De vinho, de poesia ou de virtude, à vossa maneira. Mas embriagai-vos. E se, alguma vez, nos degraus de um palácio, sobre a grama verde de um precipício, na solidão morna do vosso quarto, vós acordardes, a embriaguez já diminuída ou desaparecida, perguntai ao vento, à onda, à estrela, ao pássaro, ao relógio, a tudo que foge, a tudo que geme, a tudo que anda, a tudo que canta, a tudo que fala, perguntai que horas são; e o vento, a onda, a estrela, o pássaro, o relógio, responder-vos-ão: 'É hora de embriagar-vos! Para não serdes os escravos martirizados do Tempo, embriagai-vos: embriagai-vos sem cessar! De vinho, de poesia ou de virtude, à vossa maneira'." Charles Baudelaire

Valeu, Annita!

quarta-feira, novembro 09, 2011

Fragmento de uma carta-compromisso

Não, não vou me embrutecer. 
A vida é bonita demais para ser moeda de troca 
Num carteado de apostas vazias e casuais 
Vou resistir à perenidade de fantasias tolas
E abdico, por ora, das vitrines virtuais.

(LUISA DE CASTRO) 

terça-feira, novembro 08, 2011

De sintonias inesperadas

“Ahora estamos sostenidos en el tiempo acá sobre esta ruta, no estamos en él, esta línea que trazamos con el auto está fuera del plan, fuera de la red, del entramado. Venimos de y vamos hacia pero acá no hay, este camino no existe, somos nosotros suspendidos, de la mano entre luces, sobre sillones, sin música, sin cigarrillos, sin café, sin infusión, sin necesidades, con noche sólo, nada más.”
Agosto, Romina Paula
Fonte: http://www.editorialentropia.com.ar/agosto.htm


"Pero a lo que iba es a que mi deseo es que alguien me quiera por ser como soy cuando estoy sola, ja, por como soy cuando estoy sola, cuando estoy siendo sola y que me mire y me sonría ese alguien otro y apruebe y acompañe y calle, tolere, eso, que sobre todo tolere mi silencio pero desde un lugar de sábado de sol por la tarde, de sábado por la tarde de sol en una tarde de sol y su mirada sobre mí que aprueba, acompaña y sólo mira, eso, sobre todo sólo acompaña y no quiere tener, tener ya, tener todo, ese hambre todo el tiempo, ese desaforo incomprensible por tomar y tocar, tocar y agarrar, agarrar y recorrer, recorrer y tener más y más y más y basta de una vez por favor, sólo mirar y acompañar, mirar y entender, mirar y querer y nada más que eso."

Fragmento, Sábado de sol por la tarde
Fonte: http://www.editorialentropia.com.ar/romin.htm
¿Vos me querés a mí?, Romina Paula

terça-feira, outubro 25, 2011

Levai-me aonde quiserdes! - aprendi com as primaveras
a deixar-me cortar e a voltar sempre inteira.

(cecília meireles)


O dia mais triste


Por Luiza de Castro


Amigo, é este o dia mais triste da minha vida.
Meus sonhos todos se desfizeram.
A ilusão do amor é a dor mais dor que existe.
É mais que estar triste,
É mais de sofrer ou padecer
É mais que morrer de cede
É mais que desfalecer
É desfalecendo, querer se enterrar
E ficar ali quieta, num 'jaz para sempre' infinito
Até a dor passar.
Não é uma ferida sangrando, nem um corte profundo.
É sentir que naquela dor invisível assenta-se toda a dor o mundo.
É a vontade de fazer sangrar, de enfiar o dedo no coração
Para que todos possam ver e lamentar
E que sofram junto, se possível.
Que possam compreender, e acarinhar,
e relevar a cara desencantada, e perdoar seu mau humor,
e falar coisas suaves, e moderar o tom da voz,
e propor um aconchego, e revelar as artimanhas secretas dos piratas do estreito de Bósforo
para desatar os nós.
E, por fim, lhe oferecer um fósforo aceso para explodir
todo sentimento que lhe corrói as entranhas como combustível para uma dor que ninguém vê,
ninguém sente. Só você. Só.

domingo, outubro 09, 2011




Em 2009 fiz uma musiquinha chamada Self made man. Na época pedi para o meu único e mais querido amigo, músico e poeta, para cuidar da melodia... Na minha cabeça a letra pede uma voz fofinha como a da Mallu Magalhães, assumindo uma sonoridade irônica. Mas pouco entendo de música, cifras etc. Este post é uma forma de pressionar o meu amigo para que, inspirado pelo recente movimento "Occupy Wall Street" (vídeo), ele faça uma melodia legal para a letra abaixo. E então, poeta?!

Self made man
Letra: Malu Muniz
Música: aguardando...

Self made man...Self made man...
me deixa andar por sua rua-parede
E eu pinto um mural pra você


Wall street, let me pass by
Wall street: only if you can buy


Self made man, me ensina a ser como você
Pra eu passar na sua TV...

Quero acessar a sua rede...
E pintar a sua parede...
Quero comer da sua big apple
Quero um pedaço da sua apple pie

apple pie: only if can buy
apple pie: only if can buy
Apple pie: only if can buy

Self made man, Self made man, Self made man

Me ensina a ser como você
Pra eu passar na sua TV...

Quero acessar... a sua rua-parede
Quero comer... a sua rede
Quero pintar... a sua big apple
Quero um pedaço... da sua TV

Wall Street, let me pass by
Wall Street: only if you can buy


Self made man, Self made man
Deix'eu raspar o seu arranha-céu estrelado
Quem sabe ele está premiado...

sexta-feira, outubro 07, 2011

Tempo de chuva...





Brasília, DF - É bem bonito ver a chuva caindo no solo depois de meses ausente. Para quem tem um pé (ou os dois) na poesia, torna-se naturalmente um convite para criação de versos, para rima... Mas qual palavra rima com chuva? Luva?! Mais fácil tentar rimar com sentimentos e desejos; com a vontade de renovar-se, com a procura pelo novo, com a espera pelas próximas estações, com o sentimento de uma continuidade (mas não de continuísmo). É com prazer que vejo o mato seco, cor de papel pardo, mudando de cor, encharcado. Não se trata de um parnasianismo deslocado ou um fugere urbem em pleno século XXI. É mais um deixar-se tocar pela Pachamama, numa perspectiva de integração com novas dimensões da vida, com novos tempos e espaços. Trata-se de uma busca constante que nutrimos, ainda que abrigados em nossos automóveis, aguardando o sinal abrir caminho para a próxima estação. É tempo de chuva!

quinta-feira, julho 07, 2011

Cantos de Brasília



- Tenho cara de palhaço?

Olhando o passado pelo retrovisor







De olho nas paredes...
Elas falam!











Pausa para o descanso                                                                                                                    - Vai um golinho aí?

quinta-feira, abril 28, 2011

Poesia



neste país sem memória
vou construir um memorial
em memória de todos os
construtores de cidades
Memorial
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Nicolas Behr 

terça-feira, abril 26, 2011

segunda-feira, abril 18, 2011

Parada obrigatória


Cartaz em parada de ônibus _ Brasília (DF)

                                                  





                         Clique nas imagens para ampliar

Procura-se: cidadania


     'Encamadas'

quarta-feira, março 09, 2011

Personagens do carnaval...


À trois...



Saldão...



Um estranho na multidão



Reflexos do carnaval


domingo, março 06, 2011

Conjugação da ausente _ Vinicius de Moraes (trecho)

Tua graça caminha pela casa
Moves-te blindada em abstrações, como um T. Trazes
A cabeça enterrada nos ombros qual escura
Rosa sem haste. És tão profundamente
Que irrelevas as coisas, mesmo do pensamento.
A cadeira é cadeira e o quadro é quadro
Porque te participam. Fora, o jardim
Modesto como tu, murcha em antúrios
A tua ausência. As folhas te outonam, a grama te
Quer. És vegetal, amiga...
Amiga! direi baixo o teu nome
Não ao rádio ou ao espelho, mas à porta
Que te emoldura, fatigada, e ao
Corredor que pára
Para te andar, adunca, inutilmente
Rápida. Vazia a casa
Raios, no entanto, desse olhar sobejo
Oblíquos cristalizam tua ausência.
Vejo-te em cada prisma, refletindo
Diagonalmente a múltipla esperança
E te amo, te venero, te idolatro
Numa perplexidade de criança.

segunda-feira, fevereiro 21, 2011

Canção de ninar... (Luísa de Castro)

Não sô mais fia...
Sô orfã.
Não sô mais fia,
Sô orfã.
Cadequê o fio se esticô

Não sô mais fia, 
Sô orfã. 
No afã de ser mais eu
No afã de amanhecê

No afã de me saber
No afã de germinar...
Não sô mais fia...
Sô orfã de mamã e papá
Sô orfã
De papá e mamã vivos!

Não sô mais fia, 
Sô orfã. 
No afã de me bem querê e de crescê 
E de, um dia, ser eu mamã... 


COMISSÃO DA VERDADE

Para que serve?
Por João Batista de Abreu em 18/1/2011

Professor, poeta, cronista e um dos maiores conhecedores da obra de Carlos Drummond de Andrade, o mineiro Affonso Romano de Sant’Anna tropeçou em pedras no meio do caminho ao condenar a criação da comissão da verdade, para investigar os crimes praticados em nome do Estado brasileiro durante o regime militar (ver aqui).
Independentemente da posição ideológica de cada cidadão brasileiro, as famílias têm o direito de localizar seus entes desaparecidos, assim como o Estado democrático tem o dever de colaborar para que seja recuperada a veracidade dos episódios da trama política, mesmo os mais escabrosos. Do contrário deixaremos insepulto um cadáver que mancha a tradição do país e, particularmente, das Forças Armadas brasileiras e de membros do Ministério Público, que fingiam ignorar as denúncias apresentadas pelos réus e advogados de defesa durante audiências na Justiça militar.

O livro Diário de Fernando – nos cárceres da ditadura militar brasileira, em que Frei Betto narra os suplícios do frei dominicano Fernando de Brito, ex-preso político, traz um depoimento importante sobre a relação entre os torturadores e o Estado:

"A tortura no regime militar brasileiro é sistêmica; suas diretrizes foram definidas pelo Conselho de Segurança Nacional. Portanto não deriva de abusos. Os agentes do DOI-CODI usam codinomes, trajes civis e são impedidos de corte militar dos cabelos. Atuam em grupos de três a cinco, e seus endereços são preservados".

História preservada
Quase todos os países da América e da Europa Oriental que viveram sob ditaduras durante a Guerra Fria instauraram comissões para investigar os crimes de Estado. A vizinha Argentina – onde a repressão foi muito mais violenta do que no Brasil – tornou públicos documentos secretos e prendeu oficiais e ex-presidentes envolvidos em assassinatos e desaparecimentos. Uruguai, Chile e Peru seguiram o mesmo caminho e recuperaram a história dos tempos do arbítrio. Somente o Brasil insiste em varrer a sujeira para debaixo do tapete.

Se é verdade que um grupo de sete pessoas não tem poder bastante para levantar os nomes dos torturadores, que cometeram as maiores atrocidades em dependências militares como o DOI-CODI, em São Paulo, e o quartel da Polícia do Exército, no Rio de Janeiro, então poderíamos questionar qualquer decisão da Justiça criminal, porque sete é o número de jurados que decidem a sorte dos acusados de crime de morte, nos julgamentos em primeira instância.

Por que não tornar público os nomes de empresários que financiaram a Operação – paramilitar – Bandeirantes (Oban), criada na ante-sala dos gabinetes oficiais? Por que não divulgar os nomes de donos de jornais que emprestavam veículos para operações antiguerrilha? A quem interessa manter os jovens brasileiros à margem dessa página obscura de nossa História?

O historiador francês Marc Bloch, herói da Resistência, cunhou um pensamento peculiar sobre a importância do conhecimento. Preso pela Gestapo em Lyon, à espera do fuzilamento, escreve uma carta ao filho de seis anos sobre o valor de se estudar História. Primeiro, ele questiona a idéia de que um conhecimento profundo evitaria a repetição dos erros do passado. Se assim fosse, não haveria nazismo. Para quem pensa que a História serve para combater as injustiças sociais, Bloch argumenta que, se assim fosse, não estaria ele prestes a ser fuzilado. Para que serve a História? Poderíamos dizer que serve para mostrar que em tempos de arbítrio, seja qual for o matiz da ditadura, os crimes de Estado não atingem apenas aqueles que se opõem ao regime, mas a toda uma geração que viveu sob o signo do medo.

sábado, fevereiro 12, 2011

E a chuva vem com hora marcada...

"E a gente no meio da chuva... a girar, que maravilha..."


Brasília, DF - 12 de fevereiro de 2011


segunda-feira, fevereiro 07, 2011

Battisti clandestino!

Durante o show, no embalo da música de Chao, um rapaz foi ao microfone para protestar contra a prisão de Cesare Battisti, que permanece na penitenciária da Papuda, em Brasília. 

Para mais sobre o caso do italiano preso em solo brasileiro a despeito da decisão do ex-presidente Lula em  dezembro de 2010, ver aqui ou aqui







Brasília, 6 de fevereiro de 2011
Show do Manu Chao

Niteroiense... clandestina!

Brasília, 6 de fevereiro de 2011
Manu Chao - Clandestino

E vale como homenagem à odisseia de tentar obter uma nova identidade, um número que me identifique como cidadã brasileira... Antes, devo precisar de um outro numerozinho que me identifique como aquela que aguarda na fila para ser atendida, entre outros tantos que também buscam seus documentos numerados. A caminho da fila uma senhora de cadeira de rodas faz questão de me indicar o caminho até o guichê. Puxa-me pela Frida Khalo, a bolsa, dizendo que gostaria de ter uma igualzinha... "Quero uma dessa. Onde posso comprar uma dessa?" Não cheguei a lhe contar, mas foi artigo peculiar garimpado em lojinha numa galeria fofinha da Corrientes, Buenos Aires. A moça me deu o privilégio de acompanhá-la até o subsolo no elevador que traz uma placa retangular com um visível "EXCLUSIVO".  Ela me chama de "Neném" para indicar que eu entre e segure a porta automática para ela avançar com suas rodas aparentemente pesadas. Noto seus pés inchados com meias sufocantes -tudo aparentemente. A voz eletrônica informa que é hora de deixa o elevador seguir seu curso e ela dialoga, informando que ainda não embarcou completamente. A viagem é curtíssima. Pronto, chegamos! Ela tem seus justos privilégios e vai logo passando a frente na enorme fila, que não chega a ser uma fila, mas um pequeno amontoado de pessoas em busca de um papel. A "Neném" aqui fica perdidinha, tentando encontrar alguém que lhe informe os "ondes" e "comos" necessários. Em poucos (!) minutos descubro que a pergunta certa seria também "como que roupa eu vou?".  A foto da identidade não pode ser tirada com os ombros desnudos e eu estou com uma tomara que caia especialmente selecionada no armário para enfrentar o calor de mais de 30ºC - segundo minha sensação térmica que não me engana. Sem lenço nem documento, por enquanto, volto para casa. Ainda preciso resgatar minha certidão de nascimento para dar entrada no pedido por uma nova identidade, um número que me diga quem eu sou... Mentira. Uma sequencia numérica não vai dar conta dessa informação. Isso é o tipo de coisa que quando descubro é porque mudou tudo e parto em busca de nova identidade. 

"Niteroiense clandestina!"  

Clandestino
Solo voy con mi pena
Sola va mi condena
Correr es mi destino
Para burlar la ley
Perdido en el corazón
De la grande Babylon
Me dicen el clandestino
Por no llevar papel
Pa' una ciudad del norte
Yo me fui a trabajar
Mi vida la dejé
Entre Ceuta y Gibraltar
Soy una raya en el mar
Fantasma en la ciudad
Mi vida va prohibida
Dice la autoridad
Solo voy con mi pena
Sola va mi condena
Correr es mi destino
Por no llevar papel
Perdido en el corazón
De la grande Babylon
Me dicen el clandestino
Yo soy el quiebra ley
Mano Negra clandestina
Peruano clandestino
Africano clandestino
Marijuana ilegal
Solo voy con mi pena
Sola va mi condena
Correr es mi destino
Para burlar la ley
Perdido en el corazón
De la grande Babylon
Me dicen el clandestino
Por no llevar papel
Argelino clandestino
Nigeriano clandestino
Boliviano clandestino
Mano negra ilegal


***





sábado, fevereiro 05, 2011

Longevidade...


Brasília, DF - 5 de fevereiro de 2011 

quarta-feira, fevereiro 02, 2011

domingo, janeiro 16, 2011

A margarida...


Amarga ida*

Pintei essa margarida, minha margarida, pensando em muitas coisas... coisas pessoais, algumas íntimas demais para esta espécie de diário virtual em que este blog se converteu, como tantos outros. Em meio ao azul, provocada pela constante atualização quanto aos números da substantiva tragédia, meu pensamento foi levado à montante... Logo um contraste se fez presente. Faltaria um muito de marrom nesta tela, caso fosse um retrato fiel. Mas não quis ser fiel à nada, especialmente não à realidade. Esta senhora tão dura, tão difícil de encarar nos olhos, tão surpreendente... Ou tão previsível? Minha pintura, por limitações técnicas, comporta apenas 1D. Ao contrário das modernosas telas de cinema, uma dimensão me basta neste momento. A dimensão da arte, aquela que torna possível as abstrações, quando estas, por sua vez, representam o caminho menos doloroso e mais palpável para assimilar a realidade. Compreender aquilo que desmorona, o que é desconstruído, o que de uma hora pra outra, simplesmente, deixa de ser. Aquilo que, apesar das dúvidas, espera para re-ser, re-nascer. Pensando nisso tudo e com tantas outras abstrações em mente, a margarida ganhou espaço na cartolina, com as cores insistentes da possibilidade misturadas às tonalidades múltiplas do porvir.       

* Este jogo de palavras devo ao professor Gisálio Cerqueira Filho.  




Uma flor nasceu na rua!

Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.

Uma flor ainda desbotada

ilude a polícia, rompe o asfalto.

Façam completo silêncio, paralisem os negócios,

garanto que uma flor nasceu.



Sua cor não se percebe.

Suas pétalas não se abrem.

Seu nome não está nos livros.

É feia. Mas é realmente uma flor.



Sento-me no chão da capital do país às cinco horas da tarde

e lentamente passo a mão nessa forma insegura.

Do lado das montanhas, nuvens macias avolumam-se.

Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico.

É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.


A flor e a náusea - Carlos Drummond de Andrade