quarta-feira, junho 13, 2007

Jornal Velho x Jornal novo

Tenho fixação por jornais velhos. Verdadeira tara por algo que precise conferir daqui a alguns anos e que, por ter despejado no lixo aquele velho jornal, fique eternamente sem saber. Sim, é um drama. Nunca disse que não gostava de dramas. Minha obsessão é pelas informações que, com certeza, passarão despercebidas na primeira leitura. Na verdade, admito, minha obsessão é justamente por aquelas que não absorvo. Terrível condição humana esta que Deus – para quem acredita, claro – criou... O jornal de ontem é por demais interessante aos meus olhos, pois representa um desafio e me impõe debochadamente uma pergunta: o que ficou por saber? Qual parte dessas folhas, em breve amareladas, não absorvi?

Tenho fixação por jornais velhos. E, hoje que vejo seus esqueletos na tela do computador, meus sintomas se agravam terrivelmente, posto que a sensação passou a anteceder a impressão. À medida que ele – esse jovem que já nasce adoecido pela velhice precoce – vai ficando pronto, começam as perguntas. O que faltou? O que sobra? O que está fora do seu lugar?

Certo dia, uma colega, famosa por emitir opiniões contundentes, me surpreendeu com uma simples constatação, quando viu minha cara de insatisfação ao olhar no jornal do dia o produto do meu trabalho.

– Foi impresso... - disse com seu infalível sorriso irônico.
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- Mete um calhau, mete um calhau!
Diz ela que acordou com essas palavras depois de um pesadelo em que a sua apuração não condizia com o espaço e diagramação da matéria na página do jornal.
Depois de se desesperar tentando inventar os fatos (como se essa não fosse um pouco nossa tarefa, confesso...), ela se rendeu ao tapa-buraco oficial do jornalismo e pediu, implorou:
- Mete um calhau, mete um calhau!
Tentou antes dialogar com o editor, dizer que havia sido pautada para fazer uma matéria menor, totalmente diferente... Em vão. E para não deixar o vão, pois isso é coisa inaceitável, apelou:
- Mete um calhau!
Sim, há vãos. Mas não representam a sobra de espaço e sim a falta de informação. Remédio: criatividade. Ou então...
- Mete um calhau!
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domingo, junho 10, 2007

Série Desconhecidos: Alheio







Estava entre elas e não estava. Enquanto pude testemunhar, estava alheio. Parecia estático com seu ar europeu, mas seus olhos... De novo os olhos...

Se o corpo de fato fala, confesso que não consegui escutar o que diziam suas mãos descansadas sobre a perna e a bengala. Entre as outras ele estava estático, por isso creio que já há alguns minutos havia saído daquele banco e talvez percorresse espaços outros, distantes daquela praça.








Mãos e pernas dialogavam entre si. Cruzadas em sinal de retração, talvez. Espalmadas, em sinal de prontidão, possivelmente. E as dele alheias, em sinal de distração. É provável que as últimas assim se mantivessem por não valer a pena retrair-se e porque, talvez, nem sempre seja requisito básico estar pronto e atento. "Distraia-se", me disse aquele senhor. "Relaxe", sugeriram suas mãos e pernas. Alheias, embora despertas.

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Citação: "A gente acaba se acostumando com a chegada dos anos, eu pensei, enquanto as luzes iam se apagando na Avenida Montaigne. E prometi a mim mesmo que em 2007 eu ia mudar alguma coisa. E resolvi que havia de ser essa mania besta de deixar o coração na prateleira, ao alcance da mãe de alguém que já lhe quer tocar..." (Miguel Falabela, sem preconceitos!)